Desenvolvimento do Nível de Jogo em Alunos do 3º Ciclo nas Modalidades de Futebol e Basquetebol: A Eficácia de um Programa de Intervenção com Base em Exercícios de Trabalho Cooperativo

Level of Play Development in the Key Stage 3 Students in The Modalities of Football and Basketball: The Effectiveness of an Intervention Program Based on Cooperative Work Exercises

Bruno Gonçalves1, João Guerra1, Clarinda Pomar2 y Hugo Folgado3

1Universidade de Évora, Departamento de Pedagogia, Escola de Ciências Sociais

2Universidade de Évora, Centro de Investigação em Educação e Psicologia

3Universidade de Évora, Departamento de Desporto e Saúde, Escola de Ciências e Tecnologia

Artículo publicado en el journal Gymnasium del año 2017.

Publicado 17 de enero de 2017

Resumen

Uma das funções educativas da Educação Física prende-se com a orientação para a sociabilidade, cooperar com os companheiros é uma das competências fundamentais para o alcance dos objetivos nos jogos desportivos coletivos. Este estudo analisou os efeitos de um programa de intervenção com base em exercícios de trabalho cooperativo relacionando-o com o nível de jogo da equipa, sendo aplicado numa turma de 9º ano durante as aulas de Educação Física. Elaborámos oito exercícios com constrangimentos específicos que promovem as interações entre alunos durante o jogo. Após caracterização das capacidades e competências individuais de 16 alunos, formaram-se dois grupos homogéneos – grupo de intervenção e grupo de controlo. A performance de ambos os grupos foi avaliada numa situação de jogo 4x4 em dois momentos, pré e pós-intervenção, nas modalidades de futebol e basquetebol. Durante 6 semanas, o grupo experimental realizou o programa de intervenção, enquanto o grupo de controlo realizava exercícios usuais que promoviam a aquisição de habilidades e competências de acordo com os Programas Nacionais de Educação Física. Os dois momentos de avaliação foram registados em vídeo para comparar os grupos e verificar os efeitos do programa de intervenção. O movimento dos jogadores foi convertido utilizando o software TACTO e estes dados analisados com o software MATLAB. Estes procedimentos permitiram analisar as variáveis; (i) regularidade da distância do aluno ao centro geométrico da própria equipa; (ii) regularidade da distância de cada aluno ao centro geométrico da equipa adversária; e (iii) sincronização entre alunos da mesma equipa. A análise estatística mostrou que o programa de intervenção produziu efeitos no grupo experimental, nas variáveis: (ii) regularidade na distância de cada aluno ao centro geométrico da equipa adversária em ambas as modalidades; (iii) sincronização dos alunos da mesma equipa nos movimentos longitudinais em basquetebol. Os resultados sugerem uma melhoria nos comportamentos associados ao nível de jogo. Verificou-se um aumento da imprevisibilidade nos movimentos de cada aluno face à equipa adversária, criando-se maior incerteza no adversário, ao mesmo tempo que se manteve a previsibilidade de movimentos face à própria equipa, bem como o aumento da sincronização interpessoal em basquetebol, características que estão relacionadas com nível de perícia tática em equipas profissionais.

Palabras clave: Trabalho cooperativo, Nível de jogo, Educação Física, Programa intervenção, Exercícios, Futebol, Basquetebol

Abstract

One of the educational functions of physical education is related to the guidance for sociability, cooperate with colleagues is one of the core competencies to achieve the objectives in collective sports games. This study examined the effects of an intervention program based on cooperative work exercises, relating it to the team’s level of play, being applied to a class of 3rd cycle of basic education during physical education classes. We have elaborated eight exercises with specific constrains that promote interactions between students during the game. After characterization of individual capacities and skills of 16 students formed two homogeneous groups – the intervention group and the control group. The performance of both groups was evaluated in a 4x4 game situation in two stages, before and after the intervention, in the sports of football and basketball. For six weeks, the experimental group performed the intervention program, while the control group performed usual exercises that promoted the acquisition of skills and competencies according to the National Program of Physical Education. The two moments evaluation were recorded on video to compare the groups and to check the effects of the intervention program. The movement of players has been converted using the software TACTO and the data analyzed using MATLAB software. These procedures have allowed analyse the variables: (i) regularity of the student’s distances to the geometric center of the team; (ii) regularity in the distance of each student to the geometric center of the opposing team; (iii) synchronization of students of the same team. (Jacinto, Comédias, Mira, & Carvalho, 2001) Statistical analysis showed that the intervention program was efetive in the experimental group, the variables: (ii) regularity in the distance of each student to the geometric center of the opposing team in both sports; (iii) synchronization of students of the same team in the longitudinal movements in basketball. The results suggest an improvement in the behaviors associated with the level of play. It was verified na increased unpredictability in the movements of each student in relatio with the opposing team, creating greater uncertainty in the opponent, while maintaining the predictability of movements in the team itself, as well as increased interpersonal synchronization basketball. Characteristics that are related to level of tactical expertise in professional teams.

Keywords: Cooperation work, Play level, Physical Education, Intervention program, Exercises, Football, Basketball

INTRODUÇÃO

A cooperação é uma competência presente nas interações de grupos e que se verifica em vários contextos da sociedade, desde o académico ao desportivo. Rossum e Gagné (2005) apresentaram um desenho conceptual teórico onde sugerem que os processos envolvidos no desenvolvimento sistemático de competências académicas (por ex. linguagem), sociais e outras, dão-se por meio de catalisadores intrapessoais e do meio que envolve o jovem. Estes estimulam as habilidades naturais (liderança, persuasão, comunicação) e constituem fatores chave para o desenvolvimento de competências. Isto demonstra que uma competência não se desenvolve de forma isolada e independente das outras e, por outro lado, não se manifesta apenas num determinado contexto, podendo transferir-se a outras áreas.

Em contexto escolar, os comportamentos cooperativos verificam-se em ambientes onde os alunos interagem e em que as decisões individuais servem um interesse comum. Nas aulas de Educação Física (EF) o professor pode criar situações de aprendizagem e influenciar os ambientes em que ocorrem as relações interpessoais dos alunos. Os jogos desportivos coletivos (JDC) podem ser vistos como atividades em que os alunos cooperam porque partilham um objetivo comum e estão perante outro grupo que se opõem a esse objetivo. Neste sentido, os JDC promovem um aumento das interações entre alunos pois estes implicam que os praticantes intercetem adversários ou bolas envolvendo-se numa dinâmica de coordenação interpessoal, assumindo que um estado de elevada coordenação interpessoal é caracterizado por comportamentos cooperativos, deste modo a exposição dos alunos a situações de aprendizagem em que as relações interpessoais cooperativas resultam em benefício mútuo podemos assumir que as aulas de EF são um meio para o desenvolvimento da cooperação, através de práticas e aprendizagens que maximizam o potencial das habilidades envolvidas. Os Programas Nacionais de Educação Física apresentam esta competência como condição comportamental necessária para a concretização de objetivos em diversos JDC, sendo uma das finalidades da disciplina de EF. Isto revela a importância e a necessidade em promover a cooperação, utilizando-a como estratégia fundamental das práticas pedagógicas, considerando que, para realizar um intervenção coerente é necessário uma adequação entre os objetivos, as situações de aprendizagem e a avaliação, que dependem de uma reflexão das estratégias a utilizar (Siedentop, 2008). Não obstante, a concretização deste estudo exigiu a prospeção sobre os efeitos educativos e a deliberação sobre os processos formativos que estavam envolvidos, havendo a necessidade de enquadrá-los nos objetivos curriculares dos alunos.

Considerámos a abordagem baseada nos constrangimentos (ABC) às ações dos alunos (Newell, 1986; Davids, Williams, Button & Court, 2001; Araújo, 2006) como o modelo mais interessante para o ensino do jogo pela compreensão (TGfU) nos JDC (Bunker & Thorpe, 1982), servindo como base teórica e conceptual para a construção de um programa de intervenção, composto por um conjunto de tarefas em que a natureza dos constrangimentos introduzidos e manipulados resultassem na emergência de comportamentos cooperativos.

Após uma análise da literatura existente verificámos que a maioria das pesquisas centram-se principalmente na caracterização fisiológica, física, antropométrica, perfis psicológicos e técnicos, tempo de prática e condições (Reilly, Williams, Nevill, & Franks, 2000). Vários autores defendem a necessidade de criar metodologias de intervenção de acordo com abordagens atuais e validadas em contexto real (Strean & Bengoechea, 2003). Vaeyens, Lenoir, Williams e Philippaerts (2008) consideram importante que surjam mais evidencias científicas tendo em vista a não-linearidade do desenvolvimento humano, ou seja, compreender como podemos influenciar um conjunto de fatores e características associados a preditores de sucesso desportivo e social.

Estudos desta natureza podem representar uma mais valia para professores de EF e treinadores ao fornecer tarefas para aplicar ou adaptar às suas práticas. Por outro lado, o avanço tecnológico, a par de novos métodos, podem contribuir para medir e avaliar competências como a cooperação. Sampaio e Maçãs (2011) desenharam um estudo para avaliar comportamentos táticos em situações de jogo reduzido no Futebol onde calcularam a fase relativa das distâncias entre cada jogador e a sua posição relativa ao centróide da própria equipa. No primeiro momento, os dados não apresentaram coordenação intra-equipa, no segundo momento os dados revelaram um aumento da estabilidade da coordenação em ambas as fases (lateral e longitudinal), sugerindo que a estabilidade de movimentos coordenados estão associados ao aumento da perícia tática. Frencken, Lemmink, Delleman e Visscher (2011) concluíram que o centróide e a área de superfície podem ser variáveis promissoras para descrever o fluxo de jogo e as oportunidades de golo.

A presente investigação foi realizada em contexto escolar durante o período da prática de ensino supervisionada do Mestrado em Ensino da Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário. Este desenho metodológico cumpriu com as funções pedagógicas exigidas, não comprometendo a boa prática escolar desenvolvida pelo grupo de EF da escola. O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia de um programa de intervenção baseado em exercícios cooperativos em alunos do 3º ciclo nas modalidades de futebol e basquetebol. Este estudo verificou a eficácia de um conjunto de exercícios com constrangimentos específicos, que facilitassem o desenvolvimento da cooperação nas aulas de EF, através dos JDC.

METODOLOGIA

Participantes

Participaram neste estudo 16 alunos (8 rapazes e 8 raparigas) de uma turma de 9º ano, com 14±0,5 anos de idade. Os alunos foram convidados a participar neste estudo como voluntários, tendo sido obtido o consentimento informado junto dos seus encarregados de educação. Após o término dos procedimentos e programa de intervenção, este foi aplicado aos restantes alunos da turma de forma a garantir a igualdade de oportunidades de aprendizagem.

Materiais e Instrumentos

Para a avaliação inicial das capacidades motoras foram utilizados os seguintes instrumentos: i) dinamómetro manual para aferir a força dos membros superiores; ii) tapete de contacto para a força dos membros inferiores realizando o squat jump e counter movement jump, iii) fotocélulas com cronómetro para os testes de velocidade e agilidade; iv) câmara digital para registar os momentos de avaliação pré e pós intervenção, colocada num plano superior de forma a cobrir todos os movimentos dos alunos dentro do espaço de jogo. A dimensão do espaço de jogo era 15m de comprimento por 14m de largura, representando o campo de minibasquetebol.

Procedimentos e Programa de intervenção

Após a realização de uma avaliação inicial aos alunos, foram constituídos dois grupos homogéneos, divididos por grupo de controlo (N=4 rapazes; N=4 raparigas) e grupo de intervenção (N=4 rapazes; N=4 raparigas). Esta divisão foi baseada na avaliação de algumas capacidades motoras através dos seguintes testes: i) velocidade - 20m; ii) agilidade - teste Illinois; iii) força dos membros inferiores - Squat jump e Counter movement jump; iv) força dos membros superiores – Handgrip. Foram ainda consideradas as habilidades específicas e competências táticas dos JDC, recorrendo aos níveis de desempenho nas modalidades de basquetebol, futebol e andebol demonstrados na avaliação inicial destas matérias, de acordo com os conteúdos do Programa de Educação Física do 3º ciclo do Ensino Básico (Jacinto, Comédias, Mira e Carvalho, 2001) e diagnosticados através da aplicação do protocolo de avaliação inicial da escola.

Os oito exercícios foram elaborados com base na ABC. Para isso, recorremos a situações de jogo modificadas, de modo a promover a tomada de decisão dos alunos, com a intenção aumentar as interações entre alunos e possibilitar a emergência  de comportamentos cooperativos. A manipulação dos constrangimentos na tarefa centraram-se nos seguintes elementos: alvo; opções decisionais do aluno (passe/progressão); zonas de pontuação e de movimentos individuais; utilização de diferentes tipos de bola (ver figuras 1 a 8).
As dimensões do espaço de jogo e o número de alunos de cada equipa foram constantes nos momentos de avaliação e de intervenção. Para verificar os efeitos do programa de intervenção, os alunos de ambos os grupos realizaram uma situação de jogo reduzido de 4x4 nas modalidades de futebol e basquetebol durante 8 minutos, em dois momentos: pré intervenção (1 semana antes da intervenção) e pós intervenção (1 semana após a intervenção).

O programa de intervenção teve uma duração de 6 semanas, com uma sessão por semana, durante as aulas de 90 minutos do 2º período escolar. Cada sessão teve a duração de 20 minutos e foi realizada após a introdução da aula e o aquecimento. Após a instrução os alunos realizavam 2 exercícios com 10 minutos de prática para cada exercício. Nas primeiras quatro sessões foram utilizados os oito exercícios, na quinta sessão os exercícios 8 e 3 e na ultima sessão os exercícios 1 e 4. Os exercícios repetidos foram aqueles em que os alunos demonstraram mais empenho durante as primeiras quatro sessões.

Tabela 1. Grupo de exercícios aplicados ao grupo de intervenção (exercícios 1 a 8) e ao grupo de controlo (exercícios 9 a 16).

Grupo de intervenção
Legenda: aluno equipa 1 (∆); aluno equipa 2 (O); passe ou deslocamento (←)


Figura 1. Descrição do exercício 1

Adaptação do jogo pré-desportivo “Bola ao capitão”. Os passes são realizados com as mãos, não é permitido o drible e a bola pode tocar o solo. Foi utilizada uma bola de iniciação ao voleibol. Para finalizar, a equipa deve invadir o meio campo adversário e, após realizar três passes consecutivos, um dos alunos receberá a bola no espaço delimitado (ver figura 1), com a mão ou com o pé. O ponto é validado quando o aluno recebe a bola e mantém-se dentro do espaço delimitado. A reposição da bola é feita na linha de fundo, em caso de pontuação, ou laterais, quando a bola sai do espaço. Variantes: passes com o pé.


Figura 2. Descrição do exercício 2

Neste exercício, joga-se com os apoios que estão junto às balizas, os passes são realizados com a mão e a bola pode tocar o solo. A bola utilizada foi a de andebol. Cada equipa pode finalizar numa das duas balizas adversárias, após a bola ter passado pelo apoio da sua equipa que está colocado na linha de fundo adversária. Variante: para finalizar, a bola deve chegar ao meio-campo ofensivo e regressar ao meio-campo defensivo. Ou, após dez passes consecutivos, o apoio pode deslocar-se também pelas laterais.


Figura 3. Descrição do exercício 3

Neste exercício os passes são realizados com a mão e a bola pode cair no solo. Para finalizar a equipa deve realizar um passe dentro da zona delimitada de linha de fundo adversária, e antes deve ter sido feito um passe ao apoio lateral. Utilizou-se a bola de iniciação ao voleibol.
Variantes: utilizar os dois apoios antes de finalizar. Finalizar com passe com o pé.


Figura 4. Descrição do exercício 4

Jogo de futebol com apoios, em que é permitida a progressão com bola e os passes são realizados com o pé. A bola utilizada foi a de iniciação ao futsal. Para finalizar a bola deve entrar na baliza adversária ou realizar uma receção controlada no espaço delimitado.
Variante: para finalizar, a bola deve passar pelos dois apoios laterais.


Figura 5. Descrição do exercício 5

Jogo dos corredores, com bola de futsal em que para finalizar as esquipas devem passar com a bola pelos três corredores, central e laterais. O portador da bola não pode cruzar corredores. Após recuperação ou início de jogo aplica-se esta condicionante.


Figura 6. Descrição do exercício 6

Jogo de basquetebol sem drible. Para a equipa finalizar, um aluno deve receber a bola posicionado dentro de um dos arcos junto à linha de fundo do meio-campo ofensivo.


Figura 7. Descrição do exercício 7

Jogo de basquetebol sem drible, em que para finalizar a equipa deve realizar quatro passes na área de meio campo delimitada, podendo depois ocupar o espaço da equipa adversária. Variante: Jogo com drible.


Figura 8. Descrição do exercício 8

Jogo de basquetebol, com drible, onde existem quatro arcos amarelos e quatro arcos verdes. Para finalizar a equipa tem de colocar um apoio dentro de quatro arcos da cor que escolher, depois pode atacar o cesto. Variante: aumentar ou diminuir o número de arcos.
Grupo de controlo


Figura 9. Descrição do exercício 9

Jogo formal de basquetebol em situação reduzida.
Os alunos apenas podem transpor a linha de três pontos para realizar o lançamento na passada, ou efetuar a defesa do cesto realizando dois apoios no máximo.
A reposição da bola é feita na linha de fundo. No caso de se verificar mais de dois apoios a posse de bola passa para a equipa adversária.
Este exercício serve para que os alunos pratiquem o lançamento na passada em situação de jogo reduzido.


Figura 10. Descrição do exercício 10

Situação de jogo reduzido 4x4 em basquetebol, sem constrangimentos. Este exercício foi aplicado no seguimento do exercício anterior (exercício 9) de forma a verificar as opções dos alunos quendo havia possibilidade de realizar o lançamento na passada.


Figura 11. Descrição do exercício 11

Jogo de basquetebol em situação reduzida 2x2.
O jogo inicia na linha de fundo (linda lateral do campo de minibasquete) o objetivo é transportar a bola até a linha de fundo da equipa adversária, verificando-se progressão individual, passes e desmarcações.


Figura 12. Descrição do exercício 12

Situação de jogo 2x1 em basquetebol, dois atacantes e um defesa, a equipa ofensiva não pode transpor a linha de três pontos em progressão individual, apenas com passe para o adversário. Se o defesa recuperar a bola deve progredir rapidamente para o meio campo ofensivo evitando a interceção. Este exercício tem como objetivo verificar o passe e corte.


Figura 13. Descrição do exercício 13

Situação de jogo reduzido 4x4 em basquetebol, sem constrangimentos. Este exercício foi aplicado no seguimento dos exercícios anteriores (exercício 10 e 11) de forma a verificar as opções dos alunos quendo havia possibilidade de realizar as competências exercitadas anteriormente.


Figura 14. Descrição do exercício 14

Situação de jogo 2x1 em futebol, dois atacantes e um defesa, a equipa ofensiva não pode transpor a linha de três pontos em progressão individual, apenas com passe para o adversário. Se o defesa recuperar a bola deve progredir rapidamente para o meio campo ofensivo evitando a interceção, deve verificar-se o passe e desmarcação.


Figura 15. Descrição do exercício 15

Jogo formal de futebol em situação reduzia 4x4. Este exercício foi aplicado no seguimento do exercício 14 e tem como objetivo verificar as competências adquiridas.


Figura 16. Descrição do exercício 16

Jogo formal de futebol em situação reduzia 4x4. Este exercício surge no seguimento de um conjunto de aulas onde foram exercitadas várias ações, foi feito um resumo e reforço das mesmas para que sejam aplicadas em situação oportuna.

Variáveis posicionais

A conversão dos movimentos dos alunos em formato de vídeo para dados cinemáticos foi feito com o software TACTO (Duarte, Ferreira, Folgado & Fernandes, 2010).  Esta ferramenta permite seguir o centro dos apoios de um jogador com o cursor, em velocidade lenta. Também foi necessário inserir 14 pontos de calibração com medidas reais do espaço de jogo, para transformar as coordenadas virtuais em coordenadas reais através do calculo de parâmetros de transformação linear direta (DLT). Após realizar este processo com todos os alunos criou-se uma base de dados com as coordenadas x-y de todos os alunos durante um jogo. Com estas medidas, foram calculadas as seguintes variáveis posicionais utilizando o software MATLAB (Mathworks Inc., EUA):
(i) evolução temporal na regularidade da distância do aluno ao centro geométrico da própria equipa; 
(ii) evolução temporal na regularidade da distância de cada aluno ao centro geométrico da equipa adversária;
(iii) sincronização de movimentos entre alunos da mesma equipa.


Figura 17. Exemplo da medida entre o aluno (equipa 1 (∆); equipa 2 (O)) e o centróide (c) da própria equipa (medida menor) e entre o aluno e centróide da equipa adversária (medida maior).


Figura 18. Exemplo da medição da fase relativa entre todos os pares de jogadores da equipa.

A medida centróide (fig. 9) ou centro geométrico é o ponto médio entre todos os alunos de uma equipa. A evolução temporal na distância de cada aluno ao centróide é uma das variáveis utilizadas para medir o processo de interação entre equipas e o comportamento da equipa, medidas que parecem estar associadas a eventos críticos e taticamente relevantes na sequência de uma análise dinâmica de um jogo de futebol de elite (Frencken, De Poel, Visscher, & Lemmink, 2012).

O nível de sincronização (fig. 10) nos movimentos entre alunos da mesma equipa, foi medido através do calculo da fase relativa.

O cálculo de entropia amostral, permitiu avaliar a similaridade temporal da sequência de comprimentos entre a distância de cada jogadora ao centroid da equipa. Este procedimento foi conseguido com o software MATLAB (Mathworks Inc., EUA)

Análise Estatística

A normalidade dos dados foi testada utilizando o teste Shapiro-Wilk. Antes de proceder à comparação intra-grupos, os resultados do pré-teste foram comparados entre grupos (controlo vs intervenção). Uma vez que os grupos revelaram diferenças no pré-teste, foi decidido utilizar a análise de covariância (ANCOVA) para comparação intra-grupos. Foi utilizado o programa SPSS 20 (IBM Corp., EUA) e o nível de significância considerado foi de 5%.

RESULTADOS

Apresentamos a comparação dos resultados das três variáveis analisadas nos dois momentos de avaliação, pré e pós-intervenção, para depois descrever a que tipo de comportamento está associado.

Tabela 2. Análise comparativa da regularidade da distância de cada aluno ao centróideda própria equipa.

Os resultados da Tabela 2 apresentam diferenças não significativas entre os momentos de avaliação, em ambas as modalidades. Alterações na regularidade da distância ao centro geométrico da própria equipa podem indicar dois factores influenciadores: i) elevada descoordenação nos movimentos da equipa, por exemplo, aglomeração dos alunos nos momentos de posse de bola e¸ ii) existência de alunos que não participam nos processos ofensivo e defensivo, deslocando-se no sentido oposto. Estes factores também não se verificaram durante a aplicação do programa de intervenção.

Tabela 3. Análise comparativa da regularidade da distância de cada aluno ao centróideda equipa adversária.

Os resultados da Tabela 3 mostram alterações significativas na regularidade da distância de cada aluno ao centróideda equipa adversária. Isto indica um aumento da imprevisibilidade dos movimentos face à equipa adversária, ao quebrar com o padrão de regularidade dos movimentos.

Tabela 4. Análise comparativa da fase relativa longitudinal entre todos os pares de alunos de cada equipa

Através dos resultados apresentados na Tabela 4 verificamos um aumento significativo na sincronização dos movimentos longitudinais dos alunos na modalidade de basquetebol, o mesmo não acontecendo na modalidade de futebol.

DISCUSSÃO

O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia de um programa de intervenção baseado em exercícios cooperativos em alunos do 3º ciclo nas modalidades de futebol e basquetebol.

Os principais resultados mostraram um aumento da sincronização nos movimentos longitudinais entre pares da mesma equipa, e o aumento da imprevisibilidade face à equipa adversária. Estes resultados demonstram que o programa de exercícios promoveu um conjunto de adaptações funcionais aos alunos do grupo de intervenção. Estas adaptações podem ser indicadoras de um maior conhecimento do jogo e de uma maior cooperação durante os momentos de avaliação.  A variável (i) regularidade da distância ao centróide da própria equipa não apresentou alterações após a aplicação do programa de intervenção. Os resultados desta variável sugerem que as ações dos alunos apresentam uma regularidade temporal na dinâmica dos seus movimentos entre pares da mesma equipa em ambas as modalidades. Isto sugere a existência de um padrão comportamental nos movimentos entre pares. A verificação de padrões de movimentos confere estabilidade à equipa e pode estar associada a comportamentos cooperativos. O resultado observado nesta variável pode suportar duas interpretações comportamentais: 1) os alunos deslocam-se predominantemente em grupo, quanto à direção do movimento; ou 2) os movimentos individuais fora do padrão foram compensados por movimentos individuais ou de grupo. Por outro lado, verificamos um aumento na irregularidade de movimentos de cada aluno relativamente ao centróide da equipa adversária, em ambas as modalidades. Isto revela que os movimentos individuais dos alunos de uma equipa foram mais irregulares face ao centróide da equipa adversária, ou seja, existiu um aumento de movimentos que procuram criar dúvida e instabilidade ao adversário. A interpretação dos resultados obtidos nestas duas variáveis no momento de avaliação pós-intervenção sugerem, por um lado, um aumento da coordenação intra-equipa em função do objetivo do jogo e, por outro lado, a criação de instabilidade na equipa adversária mantendo estabilidade na própria equipa, o que sugere uma compreensão do jogo e uma consciência das ações de nível superior.

O aumento da sincronização nos movimentos longitudinais entre pares da mesma equipa, na modalidade de basquetebol, sugere uma participação mais efetiva dos alunos durante as fases defesa/ataque e os vários momentos de jogo, como a reposição ou manutenção da posse de bola. Na modalidade de futebol não se verificaram diferenças significativas nesta variável. Consideramos que este resultado se deveu à tarefa proposta para os momentos de recolha de dados, pré e pós intervenção, em que existiam duas balizas de finalização para cada equipa, o que altera a dinâmica de jogo neste eixo de deslocamento.

Em resumo, este artigo apresenta dados com efeitos positivos no grupo experimental dando suporte a estudos já apresentados, em que se verifica uma auto-organização na coordenação interpessoal quando o objetivo da tarefa é a coordenação das interações e estes partilham a mesma intenção (Schmidt, O'Brien, & Sysko, 1999). Um dos principais fatores que levaram ao desenvolvimento da cooperação foram os fortes constrangimentos das tarefas na realização dos exercícios. O facto de selecionarmos alunos com características semelhantes também pode ter potenciado o desenvolvimento de movimentos cooperativos entre alunos da mesma equipa.

Algumas limitações foram encontradas ao longo do estudo: 1) o tipo de exercícios foram condicionados ao espaço e materiais disponíveis na escola; 2) o tempo de intervenção foi reduzido tendo em conta a natureza das competências a que nos propusemos desenvolver; 3) a compatibilidade com o calendário e as atividades escolares; e 4) o reduzido número de participantes. Noutras intervenções, seria interessante aumentar o tempo de intervenção para 7 a 9 semanas, realizar o programa em duas turmas e comparar os resultados. Seria também pertinente adicionar outras variáveis ao estudo, como o número de pontos e a quantidade de passes.

Este estudo pode representar um importante contributo para a EF, ao contribuir com uma metodologia que permite o desenvolvimento de competências como a cooperação. Este estudo releva o interesse em potenciar abordagens holísticas, nas aulas de EF, que permitem desenvolver competências nos alunos, bem como, o desenvolvimento de estratégias e métodos de intervenção que promovam a eficácia do ensino no desenvolvimento das competências sociais e relacionais.

CONCLUSÕES

O estudo apresentado pretendeu testar a eficácia de um programa de intervenção com fortes constrangimentos nas tarefas e verificar quais os efeitos produzidos nas variáveis associadas à cooperação e ao nível de jogo. Os resultados obtidos vêm dar algum suporte empírico ao modelo de ensino do jogo para a compreensão e à sua eficácia, que tem como objetivo permitir que os alunos aprendam aspectos táticos através da prática de versões modificadas do jogo, que neste caso foi conseguido fazendo uso da ABC para a concepção dos exercícios. A manipulação adequada dos constrangimentos “pode facilitar a emergência do comportamento funcional” (Araújo, 2006, p. 254) necessário para resolver uma determinada situação ou problema permitindo a obtenção dos objetivos da tarefa.

Talvez seja interessante promover abordagens dentro do ambiente escolar que validem estratégias e métodos de intervenção que estimulem o desenvolvimento e a eficácia da aquisição de competências para os alunos. Estudos deste género podem também servir de suporte para a disciplina de EF afirmar o seu contributo e a importância para a formação dos alunos e para o projeto educativo das escolas, ao contribuir para o desenvolvimento de competências socialmente valorizadas. Seria relevante poder alcançar e determinar os factores chave para o desenvolvimento de competências como a cooperação, juntamente com a criação de programas de intervenção, bem como a divulgação de novas abordagens que possam ajudar professores de EF e treinadores na sua intervenção profissional.

Referencias

1. Araújo, D. (2006). Tomada de Decisão no Desporto. Cruz Quebrada: Edições FMH.

2. Bunker, D., & Thorpe, R. (1982). A model for the teaching of games in secondary schools. Bulletin of Physical Education, 19(1), 5-8.

3. Duarte, R., Ferreira, R., Folgado, H., & Fernandes, O. (2010). Interpersonal dynamics in team sports: The role of TACTO and its applications. International Journal of Sport Psychology, 41, 62-63.

4. Frencken, W., De Poel, H., Visscher, C., & Lemmink, K. (2012). Variability of inter-team distances associated with match events in elite-standard soccer. Journal of Sports Sciences, 30(12), 1207-1213.

5. Frencken, W., Lemmink, K., Delleman, N., & Visscher, C. (2011). Oscillations of centroid position and surface area of soccer teams in small-sided games. European Journal of Sport Science , 11(4), 215-223.

6. Jacinto, J., Comédias, J., Mira, J., & Carvalho, L. (2001). Programa Educação Física (reajustamento) 3º Ciclo do Ensino Básico.

7. Kirk, D., & MacPhail, A. (2002). Teaching Games for Understanding and Situated Learning: Rethinking the Bunker-Thorpe Model. Journal of Teaching in Physical Education, 21, 177-192.

8. Reilly, T., Williams, A., Nevill, A., & Franks, A. (2000). A multidisciplinary approach to talent identification insoccer. Journal of Sports Sciences, 18(9), 695-702.

9. Rossum, J., & Gagné, F. (2005). Talent Development in sports. In F. Dixon, & S. Moon, The handbook of secondary gifted education (pp. 281-316). Waco: Prufrock Press.

10. Sampaio, J., & Maçãs, V. February (2012). Measuring Tactical Behaviour in Football. International Journal of Sports Medicine, 33, 395-401.

11. Schmidt, R., O'Brien, B., & Sysko, R. (1999). Self-organization of between-persons cooperative tasks and possible application to sport. Internation Journal of Sport Psychology, 30, 558-579.

12. Siedentop, D. (2008). Aprender a Enseñar la Educación Física (2 ed. ). Barcelona: INDE Publicaciones.

13. Strean, W., & Bengoechea, E. (2003). Beyond technical vs tactical: Extending the games-teaching debate. In J. Butler, L. Griffin, B. Lombardo, & R. Nastasi, Teaching games for understanding in physical education and sport (pp. 181-188). VA: NASPE Publications.

14. Vaeyens, R., Lenoir, M., Williams, A., & Philippaerts, R. (2008). Talent identification and development programmes in sport: current models and future directions. Sports Medicine(38), 703-714.